quinta-feira, 10 de maio de 2012

A proliferação de “templos de consumo” na Serra-ES: apropriando-se do nosso tempo


Todas as condições se reúnem assim para que exista uma dominação perfeita, para uma exploração apurada das pessoas, ao mesmo tempo como produtores, como consumidores de produtos, como consumidores de espaço” (HENRI LEFEBVRE)

Além da violência urbana, outro fato divulgado constantemente na mídia sobre a Serra é o expressivo crescimento do mercado imobiliário nos últimos anos. Diferentemente dos municípios de Vitória e Vila Velha, o produto imobiliário “padrão” no município é o condomínio fechado, de casas ou edifícios. Outra novidade recente na cidade é a proliferação de centros comerciais, mais conhecidos como shopping centers, de diferentes portes. Alguns se encontram em funcionamento, outros em construção ou como projetos. O fato é que esses “templos do consumo”, como os denomina Milton Santos, participarão cada vez mais do cotidiano do cidadão serrano, como de outras cidades capixabas.

De um modo geral, a grande mídia anuncia tais empreendimentos como representação do moderno e do conforto: “É o lugar onde encontramos de tudo!”. Além disso, é ressaltado o papel dos shoppings na geração de emprego, seja durante as obras ou quando estiverem em funcionamento. Ou são poucas as vezes que a Camila Domingues (repórter da Rede Gazeta) anuncia, toda sorridente (!), as vagas de emprego em tais setores no telejornal da hora do almoço?!

Mas nem tudo que reluz é ouro, e nem tudo que é bom, é realmente bom para todos. Os shopping centers, assim como os hipermercados, possuem um papel estratégico para a reprodução da sociedade contemporânea baseada na produção e no consumo de mercadorias. Por um lado, a construção de tais equipamentos urbanos (como os condomínios fechados) representam grandes possibilidades de ganhos para incorporadoras, tornou-se um ótimo negócio produzir espaço como salienta diversos estudiosos da cidade. Por outro, o shopping center, com seu atrativo micro-climático associado a comodidade, se revela como lugar privilegiado para o consumo. Mais que isso, tais espaços privados encerram cada vez mais a realização da vida cotidiana por meio do consumo, em função das atividades diversificadas (não apenas comércio, o shopping virou sinônimo de lazer) e do tempo (abertos até mais tarde e inclusive aos domingos).

O shopping center representa uma mudança não apenas da forma, mas do conteúdo de nossas cidades, de como nos apropriamos delas. Para ilustrar essa passagem vou recorrer a uma passagem da minha infância. Quando criança, em Taquara II (Serra), era muito comum passar as tardes de domingo no chamado “Campão”, um campo de várzea careca (hoje tem grama e está alambrado), enquanto rolava o jogo de futebol entre os adultos, eu e meus amigos jogávamos “travinha” (furingo) na lateral do campo. Era um verdadeiro “evento” do bairro. Gastávamos muita energia, e nada de grana. Hoje essas práticas têm se enfraquecido, inclusive nas periferias. Grande parte das pessoas tem aproveitado o tempo “livre” em outros espaços, agora nos espaços privados como os shopping centers, centros de futebol socyte, clubes etc. Aquele tempo que era “livre” foi apropriado pelas relações de produção, não como trabalhador, mas como consumidor.

E para fechar o assunto, é importante salientar o preço que se paga (e quem paga!) pela comodidade e pelo conforto dos shoppings tão apregoados. Recente matéria do Brasil de Fato revela que os trabalhadores do comércio são um dos que mais sofrem com extensas jornadas de trabalho (até 60 horas semanais!) e baixas remunerações. Embora sempre estejam com aquele sorriso no rosto, como daquele jovem feliz e superexplorado que trabalha em uma grande rede de fast food.

Referência: Brasil de Fato, Edição de número 476, Ano 10. 
Msc. Thalismar Gonçalves 
AGB-Vitória 
Professor de Geografia da Rede Estadual de Ensino


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